Aconteceu de
novo. Nem posso dizer que fui pego de surpresa. Eu já sabia! Ao folhear a prova de
ciências humanas e suas tecnologias do Enem 2014 (aplicada no último sábado),
percebi como a sociologia está a cada ano mais presente nesta avaliação,
chegando a figurar em pelo menos 80% das questões elaboradas. Mas, apesar de
ficar muito feliz com isso, faço mais uma vez críticas - e busco algumas
respostas - em relação a alguns equívocos que teimam em se repetir ano a ano.
Eis algumas:
1. Porque a
maior parte das instituições de ensino não valoriza a sociologia, tanto em
aspectos simbólicos quanto à alocação de carga horária? Há ainda um
estranhamento em relação ao fato de a sociologia se colocar enquanto disciplina
obrigatória nos currículos escolares. Tal fato pode ser comprovado pelas
inúmeras tentativas em retirar a obrigatoriedade por parte de parlamentares
ligados a uma elite conservadora e autoritária que não vê com bons olhos o
apelo que a disciplina faz ao pensamento crítico. Infelizmente tal pensamento
está presente no cotidiano escolar, expresso em discursos de inferiorização da
sociologia diante de disciplinas há muito estabelecidas nos currículos, tanto
por professores quanto por gestores que teimam em vê-la como disciplina
decorativa, facilmente inteligível e que dispensa maiores esforços dos alunos
no sentido de compreendê-la.
2. Partindo
desse pressuposto, alunos assimilam tais preconceitos e passam a ignorar o
potencial crítico-hermenêutico que a disciplina tem, e passam a vê-la com mera
opinião, simples exercício de achismo. Procuro
em sala de aula superar tais barreiras, mas elas foram historicamente
construídas e infelizmente são reforçadas por pessoas que a princípio seriam
responsáveis por construir uma educação integrada que valorizasse a
reflexividade.
3. Sempre
peço aos meus alunos que valorizem todos os tipos de
conhecimentos e que, a medida que as referências vão se multiplicando, eles
sejam capazes de buscar um sentido prático para o que se aprende na teoria,
consolidando assim assim sua bagagem intelectual. Infelizmente o que se vê é
uma desorganização generalizada que se reflete no desespero pré-Enem, em que se
confunde quantidade (material, horas e horas de revisão, noites mal dormidas,
questões resolvidas, bizus, etc.) com qualidade. Vivemos um processo de
especialização precoce, pois os alunos do ensino médio já escolhem a quais
disciplinas se dedicar de acordo com o curso almejado. Eles só esquecem um
detalhe: o Enem cobra tudo, e não de forma compartimentada, como alguns teimam
em ensinar, mas de forma INTEGRADA!!! Então, aquele aluno que foi a todas as
aulas de redação e faltou a quase todas de sociologia com certeza aprendeu
técnicas para uma boa escrita, mas esqueceu outra coisa: escrever o quê,
"cara pálida"? Cadê o conteúdo?
Pra encerrar, gostaria de compartilhar minha
alegria quando na manhã de hoje minha prima adolescente, que sonha em ser
arquiteta, me pediu pra ler sua redação e dizer o que achava. Há tempos não lia
algo tão bom escrito por alguém da idade dela. Fiquei maravilhado ao perceber
que aos poucos jovens como ela se tornam capazes de pensar de forma complexa e
integrada. De certa forma, renovei minhas esperanças nessa moçada. Enquanto
professor de sociologia, não vou ficar lamentando sobre o que já pontuei, mas
tenho o dever de reivindicar a todos que de alguma forma constroem a educação
no Brasil: SENHORAS E SENHORES, MAIS RESPEITO POR FAVOR!!! Pela sociologia
enquanto disciplina, pela EXTREMA NECESSIDADE DE DIÁLOGO entre os mais diversos
saberes, pela transdisciplinaridade, pela necessidade de um ensino médio
integrado de fato, que dê oportunidade aos nossos alunos de ingressarem em
universidades (se assim desejarem) como protagonistas e não como analfabetos
funcionais. Aos alunos, em especial, peço que amém tanto a busca quanto
a construção do conhecimento, que se sintam provocados e que provoquem, não com
indisciplina, mas com a sede de querer sempre mais. É o mínimo que espero de
vocês.
*Marcus Vinícius Martins
Barbosa: Professor de Sociologia do Instituto
Federal do Piauí - Campus Floriano.